domingo, 24 de fevereiro de 2013

As aventuras de Tintim ♪






Depois que eu escrevi um post de seis páginas (eu vou aprender a escrever menos) sobre o americano Superman, pensei: Porque não escrever sobre o belga Tintim?
Nada a ver uma coisa com a outra, só quis começar o post assim.
Tintim é hipster, é difícil ver fãs dele.
Não porque é ruim, é que ninguém conhece mesmo. E até quem gosta, muitas vezes nem sabe dizer o porquê.
Eu cheguei a ler algumas edições dos quadrinhos, mas só fui procurá-las depois que comecei a assistir os desenhos do Tintim (e só comecei a assistir os desenhos porque passa antes do Dr. Who)
Para conhecer o Tintim, o mais fácil é sintonizar na TV Cultura ali pelas seis e pouco da tarde, onde passa durante a semana o desenho animado, ou assistir o filme do Spilberg que saiu ano passado. Os quadrinhos são muito difíceis de encontrar e não são mais produzidos desde 1983, porque o seu criador, o famoso repórter/quadrinista, belga/francófono Hergé (apelido de Georges Prosper Remi, também conhecido como “Walt Disney europeu”), faleceu em 1983 e não queria que ninguém “adotasse” o personagem.
A obra do Hergé supra mencionada se chama “As aventuras de Tintim” e tem como personagens mais significativos:
Tintim: um garoto de 16/17 talvez 18 anos, cabelo castanho claro com um característico topete estilo calopsita e rosto de bolacha traquinas.
Normalmente veste camisa pólo azul piscina de gola branca e uma calça cigarrete cor cáqui que sensualmente deixa aparecer metade da sua meia ¾ preta. Porém, ele pode variar o figurino de acordo com a região do mundo que está e se vestir pior ainda.
Trabalha como jornalista (para onde ou para quem ele trabalha é uma incógnita, inclusive acho que ele criou suas próprias regras de jornalismo, porque o que ele escreve parece um diário de viagem)
Não tem lar, não sente fome ou sede, não se apaixona, não erra e adora dar uma lição de moral nos seus adversários em todo final de história. É um herói absoluto, de caráter e reputação ilibada, amante da verdade e da razão, além de nobre, audacioso, inteligente e perspicaz por excelência.
A inteligência dele é uma coisa muito chata... ele sempre está envolvido em algum caso de investigação criminosa ou conspiração política e aí ele vai perguntando coisas pra um e pra outro indivíduo, ligando os pontos e no final acaba desvendando todo o mistério da história só com seu raciocínio dedutivo, de modo bem previsível. Estilo Scooby-Doo.
Detalhe: ele sempre acaba amarrado por alguém mais ou menos no meio do episódio e o Milou (seu cachorro) o solta.
Milou: É o cachorrinho Fox Terrier branco do Tintim.
Aliás, cachorro de estimação só, não... ele é o parceiro do Tintim. O Robin dele.
Todo episodio ele o salva ou avisa de algum perigo.
É corajoso, leal, inteligente, aracnofóbico e chegado num whisky “Loch Lomond”. Nos quadrinhos ele “conversa” com o leitor através dos balõezinhos de pensamento  (onde percebe-se que ele é até mais racional que o Tintim)
O mais legal do Milou é que o mundo pode estar acabando, mas ele está sempre acompanhando o Tintim.
É por causa dele que eu assisto e leio As aventuras de Tintim. É o meu personagem favorito. Eu me identifico com ele e não com o protagonista... Não me surpreende nem me encanta a sagacidade e a inteligência do Tintim, mas a parceria e a lealdade do Milou sim.
Capitão Archibald Haddock: Um marinheiro rabugento, beberrão, que fica bravo com frequência, se decepciona fácil e tem péssima memória... porém, possui um coração muito bom.
É o mais simpático dos personagens. Cheio de defeitos humanos e sem nenhuma ambição a super-heroi enfadonho que nunca erra, nem peca.
O que eu acho bonito é que ele é a antítese do Tintim e ao mesmo tempo seu melhor amigo.
Professor Trifólio Girassol: Cientista, gênio, inventor que toda história tem que ter.
E também é surdo...
Os Dupondt: Parecem gêmeos mas não são. Dupond e Dupont são dois agentes da Interpol extremamente estúpidos e atrapalhados.
Bianca Castafiori: uma cantora de ópera que o capitão Haddock despreza.
Sobre a ideologia:
Algumas edições da “As aventuras de Tintim” são objeto de muita controvérsia e polêmica.
Existem pessoas que acusam Hergé  de propagar a violência, maus tratos com animais, colonialismo, anti-semitismo, racismo, nazismo, fascismo e até misoginia (quase não aparece mulheres na série). E outras que o defendem dizendo que foi ingenuidade do autor, que ele só fazia o que mandava o chefe dele, que ele pensava do jeito que todos pensavam na época, etc. Mais tarde ele se defendeu dizendo que não conseguia escapar de alguns preconceitos, devido suas origens sociais e chegou a reescrever muitas das suas obras.
A campeã de críticas e polêmica foi “Tintim no Congo”, que é uma obra bem racista onde, dentre muitos erros, representa os africanos como seres ingênuos e primitivos (até a forma como foi desenhado os africanos é meio ofensiva). A comissão pela igualdade racial conseguiu que sua comercialização fosse proibida em 2007 e no mesmo ano um estudante congolês apresentou uma queixa em Bruxelas alegando que a obra é um insulto a seu povo.
Atitude essa, tão “super hiper politicamente correta” que acaba sendo incorreta porque nessa linha de raciocínio teríamos que parar de comercializar a Bíblia também, alegando que é uma obra preconceituosa com as mulheres e os homossexuais.
Na minha opinião, a ficção não tem esse poder todo, nem a transferência dos exemplos  é tão automática assim. O fato de eu ler uma história de ficção não significa que vou sair por aí reproduzindo um comportamento da ficção. Se fosse assim, bastava escrever livros com histórias boas e puras para que construíssemos uma sociedade perfeita.
Hergé era conservador e direitista, nunca negou.
Talvez esse seja o motivo do personagem Tintim ser tão a favor da obediência as regras e a ordem estabelecida, todavia,  este mesmo personagem também ajudava os menos favorecidos e muitas vezes tomava partido deles.
Há que se considerar que Hergé viajava muito, pesquisava para fazer as historias do Tintim e realmente respeitava as culturas não-européias, mas não pode se perder de vista que a obra dele é fruto de um momento histórico, então é natural que reproduza algumas características do senso comum da época em algumas de suas obras. Ademais, Hergé não é o primeiro a ser recriminado devido a reproduzir em certo momento a ideologia da época e nem vai ser o último. Com Monteiro Lobato (cujos livros “Caçadas de Pedrinho” e “Negrinha”, chegaram a ser alvo de movimentos sociais para que não fossem mais destruídos nas bibliotecas do Brasil) e Jorge Luis Borges (poeta, tradutor, ensaísta, crítico literário e uma das pessoas mais importantes da literatura na América Latina, também tido como racista, aristocrata, elitista e favorável à ditadura na Argentina) aconteceu a mesma coisa.
O que é certo hoje pode ser errado amanhã, novos “certos” podem surgir. Doravante, alguém pode, por exemplo, falar que o escritor uruguaio Eduardo Galeano -que é tão “pop” atualmente- tem preconceito contra os católicos por conta de alguns dos seus textos e é direitista por ter sido contra o impeachment do ex-presidente do Paraguai e por falar bem do Obama, sei lá, tô inventando...
Como diz aquele ditado chinês: Não se deve jogar a água suja da banheira com a criança dentro.
Sobre o legado de Hergé:
O bom em “As aventuras de Tintim” é que o personagem induz a uma curiosidade geográfica.
O enredo é ambientado em países de quase todos os continentes e até fora do planeta, é muito rico em detalhes das culturas, dos lugares e de referências históricas, o que dá a impressão de estar se fazendo uma volta ao mundo com o personagem e aprendendo coisas com ele.
Mas como herança mesmo, Hergé deixou a popularização do estilo de desenho chamado Ligne Claire (linhas claras/democracia de linhas). É aquele tipo de desenho com linhas fortes, traços fortes (com mesma espessura e importância), cores fortes e sem sombreamento.
Andy Warhol utilizou o estilo Ligne Claire e produziu uma série de pinturas tendo Hergé como tema, bem como Roy Lichtenstein também criou pinturas baseadas em fragmentos das histórias de Tintim.
Sobre “As aventuras de Tintim e o segredo do Licorne”:
Spielberg conheceu Hergé em 1983 enquanto estava filmando Indiana Jones e conseguiu a permissão dele para fazer um filme do Tintim. Três meses depois Hergé faleceu e Spielberg teve o perfeccionismo de esperar mais de 20 anos para que o cinema inventasse a tecnologia em animação para produzir um filme com as cores e movimentos que ele queria.
Não gostei muito do filme, porém não tenho o que criticar.
Mas houve críticas. Principalmente daquele tipo de fãs que sempre cobram dos diretores de cinema uma fidelidade radical à obra que foi adaptada, que, na minha opinião, não precisa haver. Teve quem dissesse que foi um estupro a obra de Hergé lá no jornal britânico The guardian.
Particularmente também me incomodei que o nome do Milou no filme era Snowy.  Até nos desenhos animados continua sendo Milou, não sei porque no filme eles colocaram o nome americano que deram pra ele nos quadrinhos. Todavia defendo que fazer um filme não é copiar um livro usando imagem. É claro que é normal comparar a obra (livro/comic/mangá/etc) com o filme quando se trata de adaptações, mas muita calma nessa hora.
Dizer que um livro é melhor que o filme, é o mesmo que dizer que chocolate é melhor que lazanha. Acredito que deve-se  apreciar o prazer de assistir um filme, independente do outro prazer, o de ler um excelente livro e que antes de julgar uma adaptação como boa ou ruim deve-se ter em mente que são duas formas de expressão diferentes e que cada qual tem sua especificidade e seu valor.
Sobre a conclusão:
Enfim, eu gosto mais dos desenhos animados do Tintim do que do filme ou dos quadrinhos.
Achei que seria digno falar de personagens bonzinhos, pois o underground tá tão mainstream que é perigoso eles entrarem em extinção.
Se me perguntarem, eu também digo que prefiro os vilões, os revolucionários, os “faca na caveira”, os errados... e já gostava antes de ser modinha. Sempre me causou mais comoção o motivo que levou pessoas normais a se transformarem em vilões do que a predisposição genética dos mocinhos em serem bons. Também me cativa um cenário menos burguês e mais favelado.
Mas bem como não dá para não ler Adam Smith só porque é marxista, não dá para negar que as aventuras do Tintim são boas só porque ele é um burguesinho chato que nunca tá errado.
Ele é didático, é pioneiro numa certa forma de desenho, é uma celebridade na Bélgica (tendo um museu só pra ele) e é/foi inspiração para muitos quadrinistas e outros artistas.
Se eu fosse professora de geografia da quinta série eu usaria um desenho animado ou quadrinhos do Tintim em algumas aulas como recurso didático...
Nada a ver uma coisa com a outra, só quis terminar o post assim.

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