sábado, 27 de outubro de 2012

Black or White ♪




- “Meu Deus! que que é isso?”
- “Afeee o que você fez aí?”
- “Não faz mais isso em você Ana Paula, isso aí é coisa do inimigo!”
Essas foram últimos comentários que escutei sobre a minha tatuagem que é meio parecida com o desenho que está abaixo:




Estranho porque eu achei tão fofinho a primeira vez que eu o vi...
Legendei mentalmente o desenho com a mensagem: “não julgue a aparência, acredite em você!”.
Tudo por causa do ursinho, ele me ganhou.
Me encantou que mesmo sendo ele tão pequeno, tinha pose de herói e parecia querer proteger o garoto que estava dormindo de um terrível monstro.
Falou mais alto o “modelo Disney” de vilão e mocinho incutido em mim desde os seis anos de idade e a linguagem corporal das figuras.
E como eu sou pequena como o ursinho (literalmente) o desenho funcionou na minha mente como catalisador de auto-estima, simbolizando o otimismo que me falta e a esperança de que não importa o quão pequeno você seja, você pode fazer algo grandioso.
Mas ao interpretar o desenho dessa forma, eu julguei pela aparência.
O ursinho herói e o monstro malvado? Muito óbvio.
Por que o ursinho tem que ser o herói e o monstro o vilão?
Particularmente eu julguei o monstro como vilão, simplesmente porque ele era o monstro...
Ora, se ele é feio e grande, ele é o vilão. Ponto final.
E o ursinho foi julgado como heroi porque ele é fofinho, bonitinho e como é provavelmente um brinquedo da criança ele inspira confiança. Difícil supor que ele poderia querer fazer mal a ela.
Todavia, se reparar bem, é o ursinho que está armado, não o monstro.
E o monstro não está fazendo efetivamente nada com a criança.
Se trocassemos as posições -se o ursinho estivesse no lugar do monstro e o monstro no lugar do ursinho empunhando uma espada- provavelmente o monstro ia continuar sendo o vilão e o ursinho o herói.
Tudo por causa da aparência.
Entretanto, a aparência não revela o que se passa na mente do ursinho e com minha experiência como expectadora assídua de CSI, Dexter, The mentalist, Damages, Law and Order, Criminal Minds e outros... posso assegurar que o criminoso em 90% dos casos é alguém muito próximo da vitima .
Se bem que nunca vi um ursinho serial killer...
Bom, teve o Chuck o boneco assassino...
Whatever.
Importante é que: pode ser que por traz daquela fofura e pequenez haja uma mente psicótica que deseja matar crianças e ele estava justamente prestes a matar o menino a facadas quando o monstro chegou para impedi-lo.
“A maldade usa muitas mascaras mas nenhuma é tão perigosa quanto a máscara da virtude”(DESSA FRASE, não sei a referência)
O monstro pode ser na verdade o protetor do menino que veio para salvá-lo do ursinho mau.
Ou talvez... o vilão seja o próprio menino que está dormindo!
A criança pode ser um alien disfarçado que tem um plano maligno de escravizar a humanidade e o ursinho e o monstro precisam extingui-la para que a paz mundial não seja abalada.
O desenho pode significar o momento em que o ursinho fala para o monstro: “você segura o menino e eu passo o canivete no pescoço dele”
Talvez os três sejam vilões e o ursinho e o monstro estejam preparando um motim contra o garoto que por sua vez está só fingindo que está dormindo ao passo que esconde embaixo do travesseiro um revolver para matar os dois.
Talvez os três sejam amigos... o ursinho e o monstro podiam estar só brincando enquanto o menino dormia.
Com efeito, não é possível dizer se existe mesmo um vilão e um mocinho ali porque não sabe-se o contexto.
E é aí que está a genialidade dela: é um desenho relativamente ambíguo que abre precedente para varias interpretações e em contrapartida também exemplifica como é fácil trilhar o caminho da superficialidade e da estereotipia quando estamos acostumados a formular conceitos baseando-nos somente naquilo que vemos.
"Se a essência fosse igual a aparência, não teríamos a ciência." Dizia meu professor de sociologia.
E “não existem fatos, apenas interpretações” completa Nietzsche
Elaborar julgamentos à respeito de coisas que nós não conhecemos direito é uma pratica que aprendemos muito cedo na vida e é meio que um instinto de sobrevivência.
Por exemplo: a maioria das cobras listradas são venenosas.
“A maioria”, não todas.
Mas se você estiver acampando na Amazônia e vir uma cobra listrada o mais lógico é ficar longe dela não é? só pra garantir...
Mas generalizar se torna algo ruim quando origina o preconceito.
“Todo monstro é vilão”
“Todo ursinho é bonzinho”
Mas isso todo mundo sabe...
Em tempos de politicamente correto a exceção é o Bolsonário que diz ter orgulho de ser preconceituoso.
Libertariedade agora é ~tendência~.
Ser preconceituoso é o novo usar crocs laranja na balada: chama atenção porque é feio.
Mas que tem muita gente usando crocs laranja achando que é um scarpin Salvadore Ferragamo, isso tem.
Em outras palavras: nem todo preconceito é visível e recriminado... e nem todo preconceituoso sabe que o é.
Vou citar dois exemplos baseados em posts reais de facebook:

1)  O “preconceito roqueiro”
Não o preconceito contra os roqueiros, isso ta mais prá anos 80 e 90. Hoje em dia eles não são mais párias: “os marginalizados, excluídos, revoltados”... E não é incomum ver alguém que só veste preto e usa cabelo comprido. É o preconceito de uma parcela considerável dos fãs desse gênero musical que acha que somente a sua música que é boa, que somente rock é cultura e que defendem a sua preferência musical de uma forma que beira o xiismo.
O discurso usado é: “as letras são perfeitas porque são profundas, de conteúdo pleno...enquanto os outros estilos fazem letras que variam de medíocres a ruins, elaboram 3 frases e chamam de música ... a melodia do rock é pesada e complexa portanto o musico sempre é excelente enquanto os outros estilos não tem musicalidade”
E há quem faça pior: que elitiza o rock
Que defende que rock é cultura o resto é lixo...ou ainda: que rock é pra quem TEM cultura e quando um gênero musical é preterido por um número muito grande de pessoas é ruim porque a massificação representa pobreza e quem é pobre não tem cultura e quem não tem cultura não tem bom gosto musical e ter bom gosto musical significa preferir rock a todos os outros gêneros.
Ou seja, o rock acaba sendo defendido como sendo o estilo mais per­feito de música, e seus fãs sem­pre serão os que ouvi­rão a melhor música do mundo, seus ídolos esta­rão acima de quais­quer falhas e, acima de tudo: os outros esti­los, por serem popu­la­res, serão sem­pre ruins.
A questão aqui não é o que é “musica boa” e o que é “musica ruim”. A questão é que desqualificar outros gêneros musicais para legitimar o seu gênero favorito como superior aos outros, nunca é certo.
Se é para criticar alguma coisa, que não seja o gênero musical,  mas a industria da cultura  e esses empresários que constroem os artistas baseados em estereótipos.
Eu acho que todo gênero musical merece respeito.
Toda música é uma manifestação cultural, sendo boa ou ruim.
A qualidade é definida por critérios mais subjetivos que equacionais
Claro que existem músicas que devem ser apreciadas e analisadas para além do gosto (musica erudita por exemplo) onde não se pode apenas “Curtir um som”, mas sim interpretar, conhecer o período, ver as diferenças de regência etc. Mas fora isso... o que te faz gostar de uma música ou não é algo muito pessoal e intransferível e não algo possa ser ensinado.

2) O “preconceito neocult”
Os pseudocult  são aqueles malas que sempre tem opinião sobre tudo e todos, mas no fundo não sabem muita coisa.
É o tipinho de gente que diz que assiste filme iraniano, mas na verdade não perde um Big Brother.
Que se preocupa mais com o efeito estético da sua inteligência do que possuir um real conhecimento sobre assuntos específicos... em parecer que sabe do que ser sábio.
No entanto, já faz tempo que eu ando achando que existem pseudocults que evoluiram e se tornaram cults de verdade... buscaram e adquiriram cultura e conhecimento, mas pelo mesmo motivo trivial: vaidade.
Precisam ser admirados pela sabedoria...
Por fora parecem o Peter Pan: pessoas aventureiras, joviais, corajosas, com o escudo da inteligência nas mãos. Por dentro são como a fada Sininho: precisam de aplausos para viver.
Cults por fora, mas pseudocults de coração.
Eu os chamo de: neocults.
Que atire a primeira pedra quem nunca teve na timeline frases do tipo: “why so burros?”, “vão ler um livro ao invés de falar de novela” ou coisa parecida.
Concordo que sabedoria é importante. Seria uma idiota se não concordasse.
Mas achar que é melhor que os outros por que “lê muito” ou “têm cultura”, daí não, né?
Existem Paris Hilton de biblioteca que se acham muito bonitos e especiais porque compram livros ao invés de sapatos...que lêem ao invés de jogar futebol e beber cerveja.
Pode isso Arnaldo?
Existem inumeras pessoas sábias nesse planeta, mas muitas delas nem são alfabetizadas.
Cuidar do intelecto, bem como cuidar da alimentação, é necessário para a sobrevivência e não deve ser tratado como uma idiossincrasia, algo estranho, diferente, excêntrico, exótico ...
Não estou querendo dizer que na minha opinião a ciência devia acabar e a cura do câncer seria descoberta através do amor... que ao invés de aulas expositivas na Academia todos deveriam dar as mãos e brincar de ciranda cirandinha... que ao inves de ler o livro do Hemingway  as pessoas deveriam usar o tempo para trocar links de fotos engraçadas no facebook. Não. NÃÃO.
Keep doing what you’re doing.
Mas tem que ver essa mania de medir os outros pela cultura que possuem...

Ahhh esses posts de facebook ...

Eu fico só olhando, mas eu penso cada coisa...
Obvio que eu não falo mal de nada nem ninguem no facebook.
Isso é errado.
Falo mal no meu blog onde ninguém lê mesmo.
Até porque criticar facebook no facebook virou mainstream

Com o advento dos criticadores profissionais de facebook eu chego a concluir que tá faltando louça pra lavar no mundo, forminha de gelo pra encher, mosquitinho cinza no banheiro pra matar ...
E concluo principalmente que eu devo parar de reclamar.
Por que nesse momento... nesse exato momento que eu começo a criticar os criticadores do facebook... eu vejo que eu me torno aquilo que eu critico.
E cá estou eu para servir de mau exemplo e dizer que esse é o cerne do que eu aprendi a refletir.
Percebi que ao criticar quem se acha melhor do que os outros... posso estar sendo preconceituosa me colocando na posição de melhor do que aqueles que se acham melhores do que os outros.
E ainda: eu falei de “preconceito roqueiro”, mas não falei das tantas vezes que tirei sarro das musicas nacionais, nem das vezes que tentei influenciar as pessoas a gostar das musicas que eu gosto.
Critiquei a vaidade intelectual alheia, mas eu também mereço crítica. Se alguem diz que leu três livros e eu li dois eu já acho que ela é melhor que eu.
Como diria o filosofo e poeta Horacio: “Quid rides? Mutato nomine, de te fabula narrateur”(Por que ris? A anedota fala de ti, só que com outro nome)
Não sei se isso só acontece comigo, mas as vezes, na ânsia de querer fugir de me tornar algo que eu repugno e discordo, acabo tomando o caminho que vai de encontro.
Isso porque os defeitos que a gente odeia nos outros muitas vezes são reflexo daquilo que odiamos em nós mesmos....pois do contrário não seríamos capazes de reconhecê-los como defeitos.
Nós sabemos como essas reações emocionais surgem e como as sentimos.
Por exemplo: quando vemos alguém com raiva ou exibindo-se com ostentação, nós reconhecemos esses defeitos por já termos experienciado esses estados em nós mesmos. Além disso, não nos aborrece tanto ver nos outros os defeitos que não possuímos.
As vezes não é intencional ou consciente... É um mecanismo de defesa para nos protegermos da frustração e do mal estar que aquele determinado defeito nos provoca e que vemos tão melhor nos outros do que em nós mesmos.

Nas palavras do escritor Nelson Rodrigues: "O ser humano é cego para os próprios defeitos. Jamais um vilão do cinema mudo proclamou-se vilão. Nem o idiota se diz idiota. Os defeitos existem dentro de nós, ativos e militantes, mas inconfessos. Nunca vi um sujeito vir à boca de cena e anunciar, de testa erguida: - 'Senhoras e senhores, eu sou um canalha’."
Pena que você não me conheceu Nelson Rodrigues. Em homenagem à você eu digo agora: Senhoras e Senhores, eu sou uma canalha!
Imperioso ressaltar que eu não estou generalizando ou diagnosticando dizendo que eu considero que tudo que você reconhece como sendo defeito, você necessariamente possui.
Eu não tenho essa estatística, nem esse conhecimento técnico.
O que eu considero é que todos temos uma parte de nós que não gostamos e somos obrigados a carregar essa parte conosco como se fosse um fardo.
Não existe como jogar essa parte fora, o que se pode fazer é saber a hora de colocar o fardo no chão, assumir com coragem que erramos e seguir em frente.
Foi essa a grande lição que a minha tatuagem, sem querer, me ensinou: todos julgamos pela aparência, de alguma forma ou em algum grau. Criticar não ajuda, mas ficar ciente da crítica e mudar sim. Também as coisas podem não ser do jeito que a gente vê, porque mesmo se assumirmos que tudo o que vemos é verdade, a verdade nem sempre é o que parece. E bem e mal é muitas vezes apenas uma questão de contexto e perspectiva.

Last AND least, eu vos dedico minha estrofe favorita da minha musica favorita daquele que entende muito de ursinhos de pelúcia e de sofrer preconceito (e que por isso escreveu essa musica)
Senhoras e senhores, Mr. Michael Jackson:

♪♫ (…) Don't tell me you agree with me
When I saw you kicking dirt in my eyeee!
(uu-huuu!!!)
But, if you're thinkin' about my baby
It don't matter if you're black or white  (…)♫♪
     ♫♪     Tãnãnã … tããnããã... Auuu! ♫♪

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